Minha gente, boa noite ! Tudo bem por aí ?
Espero que sim.
Vamos continuar nossa saga pelas obras
de literatura da lista da Fuvest ?
O romance de hoje é Memórias
de um Sargento de Milícias, de Manuel
Antonio de Almeida.
Este romance mostra várias coisas inusitadas.
A primeira delas é que ele é uma obra única do autor. Manuel Antonio de
Almeida não escreveu outros romances... ele deixou somente uma peça de teatro, Dois Amores, e alguns textos esparsos,
talvez por causa de sua morte prematura aos 30 anos num naufrágio.
A segunda é como classificar a obra. Cronologicamente ela pertence ao Romantismo, porque foi escrita no auge
desse movimento (1854-1855). Mas sua ideologia
foge completamente dos moldes dos românticos, e se aproxima do Realismo, apesar de ainda não ter a
consistência da escola que somente chegaria com toda sua força a partir de
Machado de Assis, quase trinta anos depois...
A terceira é o uso de um anti-herói, em vez
de um herói, o que era essencial no Romantismo. A personagem principal,
Leonardo, aproxima-se dos anti-heróis picarescos
das novelas espanholas. O romance
picaresco (que vem de pícaro =
malandro) mostra personagens de caráter
duvidoso, muito distantes do herói idealizado e aprovado pelos romances
românticos, o que marca a originalidade da obra.
Narra, num estilo direto e jornalístico, a
história de Leonardo, filho de Leonardo Pataca e Maria Hortaliça, e já começa
com um tom bem-humorado: ele nasceu de uma “valente pisadela” e de “um tremendo
beliscão”...
Deixado de lado pelos pais, Leonardo é criado
pelo padrinho e depois pela madrinha, e vive uma vida de aventuras, mostrando
um caráter não muito convencional, brincalhão e inconsequente. Apaixona-se por
Luisinha, mas esta se casa com outro ao ver Leonardo com Vidinha. Depois de
muitas peripécias, vai preso, e é liberado pelo Major Vidigal, que o coloca na
vida da milícia. Novamente ele vai preso, e desta vez é liberado e entra
novamente no mundo militar, como sargento de milícias. Luisinha fica viúva e
ele se casa com ela.
É interessante verificar que o romance mostra
um Leonardo sempre tendo de decidir entre o lado da moral e o da falta de
moral: as personagens com quem ele se encontra estão num dos lados. Há alguns
que o levam a coisas erradas, e outros que tentam levá-lo para uma vida correta, mas ele sempre
acaba mantendo seu caráter de malandro.
As personagens não mostram uma profundidade
psicológica que só será vista pelas análises dos realistas. Elas são lineares, planas, não mudam de comportamento, mostram-se mais como alegorias, e representam na
verdade traços gerais dos grupos da sociedade em que viviam na época de Dom João, e que pertencem à classe mais baixa da sociedade carioca.
Mostramos dois trechos do livro para que
vocês vejam:
Quando
saltaram em terra começou a Maria a sentir certos enojos: foram os dois morar juntos:
e daí a um mês manifestaram-se claramente os efeitos da pisadela e do beliscão;
sete meses depois teve a Maria um filho, formidável menino de quase três palmos
de comprido, gordo e vermelho, cabeludo, esperneador e chorão; o qual, logo
depois que nasceu, mamou duas horas seguidas sem largar o peito. E este
nascimento é certamente de tudo o que temos dito o que mais nos interessa,
porque o menino de quem falamos é o herói desta história.
Chegou
o dia de batizar-se o rapaz: foi madrinha a parteira; sobre o padrinho houve
suas dúvidas: o Leonardo queria que fosse o Sr. juiz; porém teve de ceder a
instâncias da Maria e da comadre, que queriam que fosse o barbeiro de defronte,
que afinal foi adotado.
Passemos
por alto sobre os anos que decorreram desde o nascimento e batizado do nosso memorando,
e vamos encontrá-lo já na idade de 7 anos. Digamos unicamente que durante todo este
tempo o menino não desmentiu aquilo que anunciara desde que nasceu: atormentava
a vizinhança com um choro sempre em oitava alta; era colérico; tinha ojeriza
particular à madrinha, a quem não podia encarar, e era estranhão até não poder
mais.
Logo
que pôde andar e falar tornou-se um flagelo; quebrava e rasgava tudo que lhe
vinha à mão. Tinha uma paixão decidida pelo chapéu armado do Leonardo; se este
o deixava por esquecimento em algum lugar ao seu alcance, tomava-o
imediatamente, espanava com ele todos os móveis, punha-lhe dentro tudo que
encontrava, esfregava-o em uma parede, e acabava por varrer com ele a casa; até
que a Maria, exasperada pelo que aquilo lhe havia custar aos ouvidos, e talvez
às costas, arrancava-lhe das mãos a vítima infeliz. Era, além de traquinas, guloso;
quando não traquinava, comia. A Maria não lhe perdoava; trazia-lhe bem
maltratada uma região do corpo; porém ele não se emendava, que era também
teimoso, e as travessuras recomeçavam mal acabava a dor das palmadas.
Bem, já dá para vocês terem uma ideia...
Voltamos numa próxima oportunidade com outra obra. E leiam o livro !
Beijos ! Até mais !
Nenhum comentário:
Postar um comentário