quarta-feira, 9 de julho de 2014

Lista de obras de literatura da Fuvest - Memórias de um Sargento de Milícias



Minha gente, boa noite ! Tudo bem por aí ? Espero que sim.

Vamos continuar nossa saga pelas obras de literatura da lista da Fuvest ?


O romance de hoje é Memórias de um Sargento de Milícias, de Manuel Antonio de Almeida.


Este romance mostra várias coisas inusitadas.

A primeira delas é que ele é uma obra única do autor. Manuel Antonio de Almeida não escreveu outros romances... ele deixou somente uma peça de teatro, Dois Amores, e alguns textos esparsos, talvez por causa de sua morte prematura aos 30 anos num naufrágio.

A segunda é como classificar a obra. Cronologicamente ela pertence ao Romantismo, porque foi escrita no auge desse movimento (1854-1855). Mas sua ideologia foge completamente dos moldes dos românticos, e se aproxima do Realismo, apesar de ainda não ter a consistência da escola que somente chegaria com toda sua força a partir de Machado de Assis, quase trinta anos depois...

A terceira é o uso de um anti-herói, em vez de um herói, o que era essencial no Romantismo. A personagem principal, Leonardo, aproxima-se dos anti-heróis picarescos das novelas espanholas. O romance picaresco (que vem de pícaro = malandro) mostra personagens de caráter duvidoso, muito distantes do herói idealizado e aprovado pelos romances românticos, o que marca a originalidade da obra.

Narra, num estilo direto e jornalístico, a história de Leonardo, filho de Leonardo Pataca e Maria Hortaliça, e já começa com um tom bem-humorado: ele nasceu de uma “valente pisadela” e de “um tremendo beliscão”...

Deixado de lado pelos pais, Leonardo é criado pelo padrinho e depois pela madrinha, e vive uma vida de aventuras, mostrando um caráter não muito convencional, brincalhão e inconsequente. Apaixona-se por Luisinha, mas esta se casa com outro ao ver Leonardo com Vidinha. Depois de muitas peripécias, vai preso, e é liberado pelo Major Vidigal, que o coloca na vida da milícia. Novamente ele vai preso, e desta vez é liberado e entra novamente no mundo militar, como sargento de milícias. Luisinha fica viúva e ele se casa com ela.

É interessante verificar que o romance mostra um Leonardo sempre tendo de decidir entre o lado da moral e o da falta de moral: as personagens com quem ele se encontra estão num dos lados. Há alguns que o levam a coisas erradas, e outros que tentam levá-lo para uma vida correta, mas ele sempre acaba mantendo seu caráter de malandro.

As personagens não mostram uma profundidade psicológica que só será vista pelas análises dos realistas. Elas são lineares, planas, não mudam de comportamento, mostram-se mais como alegorias, e representam na verdade traços gerais dos grupos da sociedade em que viviam na época de Dom João, e que pertencem à classe mais baixa da sociedade carioca.

Mostramos dois trechos do livro para que vocês vejam:

Quando saltaram em terra começou a Maria a sentir certos enojos: foram os dois morar juntos: e daí a um mês manifestaram-se claramente os efeitos da pisadela e do beliscão; sete meses depois teve a Maria um filho, formidável menino de quase três palmos de comprido, gordo e vermelho, cabeludo, esperneador e chorão; o qual, logo depois que nasceu, mamou duas horas seguidas sem largar o peito. E este nascimento é certamente de tudo o que temos dito o que mais nos interessa, porque o menino de quem falamos é o herói desta história.
Chegou o dia de batizar-se o rapaz: foi madrinha a parteira; sobre o padrinho houve suas dúvidas: o Leonardo queria que fosse o Sr. juiz; porém teve de ceder a instâncias da Maria e da comadre, que queriam que fosse o barbeiro de defronte, que afinal foi adotado.


Passemos por alto sobre os anos que decorreram desde o nascimento e batizado do nosso memorando, e vamos encontrá-lo já na idade de 7 anos. Digamos unicamente que durante todo este tempo o menino não desmentiu aquilo que anunciara desde que nasceu: atormentava a vizinhança com um choro sempre em oitava alta; era colérico; tinha ojeriza particular à madrinha, a quem não podia encarar, e era estranhão até não poder mais.
Logo que pôde andar e falar tornou-se um flagelo; quebrava e rasgava tudo que lhe vinha à mão. Tinha uma paixão decidida pelo chapéu armado do Leonardo; se este o deixava por esquecimento em algum lugar ao seu alcance, tomava-o imediatamente, espanava com ele todos os móveis, punha-lhe dentro tudo que encontrava, esfregava-o em uma parede, e acabava por varrer com ele a casa; até que a Maria, exasperada pelo que aquilo lhe havia custar aos ouvidos, e talvez às costas, arrancava-lhe das mãos a vítima infeliz. Era, além de traquinas, guloso; quando não traquinava, comia. A Maria não lhe perdoava; trazia-lhe bem maltratada uma região do corpo; porém ele não se emendava, que era também teimoso, e as travessuras recomeçavam mal acabava a dor das palmadas.


Bem, já dá para vocês terem uma ideia... Voltamos numa próxima oportunidade com outra obra. E leiam o livro !


Beijos ! Até mais !

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